Problemas com a apologética evidencialista

13:51

Apologética, no cristianismo, é aquela disciplina da Teologia/Filosofia que estuda como deve ser o desenvolvimento de uma argumentação em favor da fé cristã. E a apologética evidencialista é o braço desta disciplina que busca evidências da existência de Deus na natureza e no homem na ordem de estruturar uma apologia contra o interlocutor descrente.

A mera existência da disciplina "apologética cristã" é questionável por razões que não cabem neste artigo, mas supondo que exista, de fato, uma apologética, gostaria de apontar duas razões pelas quais ela não deva ser pensada ou articulada nos moldes da evidencialista.

Em primeiro lugar, a apologética evidencialista é ou tende a ser uma apologética idólatra. O método evidencialista busca evidências e argumentos filosóficos, às vezes em diálogo com as ciências naturais (geografia, geologia, etc.), para provar ao público ateu a existência de um deus criador. E aqui reside o problema: o Deus da Escritura não é "um deus", mas sim o Deus de Israel, o Deus cujo nome é YHWH e cuja mais perfeita revelação se deu em Jesus Cristo, o Verbo que se fez carne e habitou entre nós. Enquanto a apologética evidencialista procura uma justificativa filosófica para apresentar a necessidade de um deus, o Deus bíblico sempre se apresentou de forma específica e nunca genericamente como "um deus". Na verdade, a Escritura deixa claro que defender a existência de qualquer deus que não seja o verdadeiro e específico Deus, é idolatria (c.f. At 17). "Qualquer deus" não é O Deus, e buscar um motivo intelectual como princípio para justificar brechas em sistemas filosóficos não indica a exaltação do Deus triúno revelado pelas Sagradas Escrituras.

Em suma, não existe razão bíblica para crermos que a simples afirmação de um "deus genérico", um "deus qualquer", que não seja especificamente o Deus triúno revelado em Jesus Cristo, consiste na apresentação e defesa da ideia sobre o verdadeiro Deus. Quando defendemos a ideia de um deus qualquer, cujo pódium pode ser ocupado por qualquer entidade, com qualquer nome, apresentamos ao interlocutor um ídolo, e não o Deus bíblico.

Em segundo lugar, o método evidencialista pressupõe uma epistemologia que parece ignorar a doutrina da depravação total do homem. O ensino bíblico da depravação total mostra que o homem caído, o homem natural ou "carnal" (no linguajar paulino), está não apenas alheio ao Deus verdadeiro, mas O odeia em rebeldia. O homem natural tem todas as suas faculdades maculadas pelo pecado. Sua inteligência, moralidade e arbítrio subsistem em absoluta disfunção, em rebeldia ao Deus que o criou. Assim, a razão do homem caído não é religiosamente neutra, com capacidade para operar livremente abstendo-se de pressupostos ou em latente objetividade. Ao contrário, a razão do homem caído constroi cada um de seus pensamentos com pressupostos ateístas e rebeldes. O homem natural não aceita as coisas do Espírito (1Co 2.14).

Portanto, se o ser humano caído não possui neutralidade racional, as chamadas "evidências" da apologética evidencialista não lhe provarão absolutamente nada. O homem morto em seus pecados (Ef 2.1) não tem capacidade para analisar objetivamente qualquer argumento ou evidência, por mais persuasivos que sejam. Nas operações mentais do homem natural, todas as evidências do mundo serão distorcidas e manipuladas. O homem natural, mesmo tendo a evidência de Deus diante de sua face, substitui a verdade pela mentira (Rm 1.25).

Por essas razões eu não creio que a apologética evidencialista seja um método eficiente de apologética, nem que seja biblicamente respaldado. Os crentes que gostam do método evidencialista de apologética deveriam repensar sua utilização. 

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5 comentários

  1. Mano, esse tipo de argumento fez parte da conversão de muitos homens de Deus, especialmente nos séculos XIX e XX, como, por exemplo, C. S. Lewis. Pode não ser a melhor forma de evangelismo - e nem pretende ser -, mas tem seu lugar no discipulado e fortalecimento da fé cristã.

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    1. Concordo! O ponto é: não podemos fazer de um método errado o paradigma para o procedimento naquela área. Não é porque Deus é misericordioso, soberano, gracioso e salva pecadores independentemente de nossos equívocos e imprecisões, que esses equívocos e imprecisões devam ser consolidados como métodos biblicamente chancelados.

      Mas que o evidencialismo tem seu lugar no discipulado e, em algum nível, no fortalecimento da fé, tem.

      Abração, Júnior!

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  2. Seu texto apresenta uma falacia muito comum quando não se entende sobre evidencia. A falacia do espantalho. Você diz:"o Deus da Escritura não é "um deus", mas sim o Deus de Israel, o Deus cujo nome é YHWH e cuja mais perfeita revelação se deu em Jesus Cristo, o Verbo que se fez carne e habitou entre nós." "um" ou "o" é conceito meramente humano aplicado a um ser atemporal, ou imaterial. Tanto afirmar que Deus seja "um" ou como seja "o" é uma questão linguística, mas a pressuposição de "um" ou "o" Deus não altera a resolução do produto. Na verdade qualquer raciocinio que tende encara a verdade precisa ser evidencialista ou então apenas se torna uma mera ideia. Se não tem como evidencia é uma mera ideia e nesse caso não pode ser caracterizado como uma verdade, tal afirmação seria falsa.
    Minha religião é a certa porque eu acredito ser. Essa frase não precisa de evidencia, logo toda religião por fé seria verdadeira, por não precisar de uma evidencia, sendo assim, o cristão não poderia refutar um islâmico, ou um espirita, já que a fonte de sua "verdade" é somente a sua crença.
    Veja que a evidencia se torna importante para atestar algo verdadeiro. Se a verdade não precisa de evidencias para ser verdade, como testificar da mesma? Tiago diz que a fé precisa ser evidenciada ou então é falsa(morta). Mas dirá alguém: Tu tens a fé, e eu tenho as obras; mostra-me a tua fé sem as tuas obras, e eu te mostrarei a minha fé pelas minhas obras. Tiago 2:18

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    1. "Seu texto apresenta uma falacia muito comum quando não se entende sobre evidencia. A falacia do espantalho."

      ➡ Não, não empreguei a "falácia do espantalho". Você encontra inúmeros vídeos de apologistas evidencialistas defendendo um "teísmo" comum entre cristãos e muçulmanos, por exemplo.

      "Você diz:"o Deus da Escritura não é "um deus", mas sim o Deus de Israel, o Deus cujo nome é YHWH e cuja mais perfeita revelação se deu em Jesus Cristo, o Verbo que se fez carne e habitou entre nós." "um" ou "o" é conceito meramente humano aplicado a um ser atemporal, ou imaterial. Tanto afirmar que Deus seja "um" ou como seja "o" é uma questão linguística, mas a pressuposição de "um" ou "o" Deus não altera a resolução do produto."

      ➡ Han??! Rs

      "um" ou "o" é conceito meramente humano aplicado a um ser atemporal, ou imaterial."

      ➡ "Um" ou "o" não são conceitos, são artigos. E são artigos indefinido e definido, respectivamente. Pesquise para que serve cada um.

      "Tanto afirmar que Deus seja "um" ou como seja "o" é uma questão linguística, mas a pressuposição de "um" ou "o" Deus não altera a resolução do produto".

      ➡ Isso não fez o menor sentido. Primeiro, não é questão linguística, mas gramatical. E jamais, nunca, never, "um" e "o" são pressuposições.

      "Minha religião é a certa porque eu acredito ser. Essa frase não precisa de evidencia, logo toda religião por fé seria verdadeira, por não precisar de uma evidencia, sendo assim, o cristão não poderia refutar um islâmico, ou um espirita, já que a fonte de sua "verdade" é somente a sua crença."

      ➡ Falso. Há o critério da coerência interna da religião/cosmovisão. Esse critério, sozinho, pode desmontar toda uma cosmovisão sem precisar de "evidências" externas.

      "Veja que a evidencia se torna importante para atestar algo verdadeiro. Se a verdade não precisa de evidencias para ser verdade, como testificar da mesma?"

      ➡ Totalmente falso. (1) Em primeiro lugar você deve estabelecer o que é uma "evidência boa o suficiente" para crer em algo (algo impossível), e, logo em seguida, deverá estabelecer o que é uma boa evidência de que a primeira evidência é boa. Isso significa que (2) o conhecimento evidencial não prova nem a si mesmo: qual é a evidência para a evidência? Não existe. Logo o conhecimento evidencial é ilógico. (3) Por isso, você não "testifica"; você a assume como primeiro princípio, como uma crença aproximadamente básica. É a crença em Deus que permite a validação epistêmica de todas as outras crenças. Percebe a inversão?

      "Tiago diz que a fé precisa ser evidenciada ou então é falsa(morta)."

      ➡ Você está, grosseiramente, misturando conceitos. A fé pede frutos (vêm depois) e não evidências (que vêm antes).

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  3. Olá, Paulo! Como leitor, fico grato por sua publicação. Cumprimento-o por seu primeiro argumento na rejeição do evidencialismo. Por outro lado, cordialmente, proponho uma ponderação, especialmente quanto ao segundo. O fato de a mente do homem natural ser caída, na compreensão reformada da ideia, não deve servir de sustentáculo para abandonar o uso dessas evidências, pois, diante de qualquer evidência o homem natural permanece incrédulo, a não ser pela iluminação do Espírito Santo.

    Além disso, apologética é evangelismo? Não. Portanto, se o evidencialismo não é o melhor caminho, isso deve ser declarado por outras razões, e não pelo seu segundo argumento. Não devemos usar a teologia natural, uma vez que a mente caída não pode compreender? Então não usaremos também as as evidências filosóficas, lógicas, históricas ou até mesmo bíblicas, porque elas também, por si só, é à parte da iluminação, não convencem.

    A apologética defende a fé não necessariamente por meio da conversão do interlocutor, mas por meio da lógica e da retórica, que podem paralisar os argumentos antagônicos, ainda que sem convencer salvificamente.

    Da suma dos seus argumentos, concluo que o evidencialismo é útil e necessário, ainda que não seja suficiente por si mesmo. Pois crer na existência de Deus, ainda que não da maneira especialmente definida por meio das Escrituras, é um passo além do estágio de descrença total, e abre caminho para o segundo passo, e para os demais métodos.

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